Como Analisar o ECG Pediátrico Passo a Passo (CHILDHEART Project) 

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A interpretação sistematizada do eletrocardiograma (ECG) em pediatria representa um desafio devido às marcantes variações fisiológicas que ocorrem durante o crescimento e ao fato de que os critérios diagnósticos clássicos foram originalmente desenvolvidos para adultos. Nesse contexto, o CHILDHEART Project surge como uma iniciativa pioneira do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, dedicada à validação de critérios eletrocardiográficos específicos para a população pediátrica. Por meio de uma série de estudos caso-controle, o projeto vem estabelecendo escores diagnósticos para as doenças dos átrios e ventrículos direito e esquerdo, baseados em análises multivariadas robustas e adaptadas a diferentes faixas etárias.

Neste post, apresentaremos como aplicar, passo a passo, uma sistematização prática para a análise do ECG pediátrico, fundamentada nas evidências publicadas pelo grupo CHILDHEART, que buscam aprimorar a acurácia diagnóstica e a aplicabilidade clínica do ECG em crianças com cardiopatias congênitas e adquiridas.

Pontos importantes antes de iniciar a sistematização

  1. O eletrocardiograma não é um Padrão -Ouro, é um “surrogate” – utilizamos ele como uma triagem para a avaliação inicial, e não como diagnóstico; 
  2. Para Interpretar o ECG em pediatria a idade é indispensável; 
  3. O ECG geralmente irá indicar a classe da doença, e não a malformação exata; 
  4. Por fim, precisa ser baseado em evidência – sempre usando dados normativos com base na idade, contexto clínico e eletrocardiográfico, garantindo a precisão diagnóstica.  

Primeiros Passos para a Sistematização

  • Passo 1: Qual é a idade? 
  • Passo 2: A onda P é sinusal? 
  • Passo 3: Intervalo PQ; 
  • Passo 4: Complexo QRS; 
  • Passo 5: Onda T. 
de Alencar JN, Costa IR, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, et al. Age-related ECG milestones for rapid detection of congenital heart disease in children: A diagnostic test accuracy study. Journal of Electrocardiology. 2025.

Passo 1 – Qual é a idade? 

Padrão neonatal precoce – 0 dias a 5 dias de vida 

  • Eixo pode estar na extrema direita; 
  • R pode ser > S em V1; 
  • S pode ser > R em V6; 
  • Onda T em V1 positiva. 

Padrão neonatal tardio – 5 dias a 1 mês 

  • Eixo pode estar na extrema direita; 
  • R pode ser > S em V1; 
  • S pode ser > R em V6; 
  • Onda T de V1 negativa. 

Padrão Infantil – 1 mês a 3 anos. 

  • Eixo está nos quadrantes inferiores (QRS de aVF positivo); 
  • R pode ser >S em V1; 
  • R tem que ser > S em V6. 

Padrão de transição – 3 a 8 anos 

  • Eixo está nos quadrantes inferiores (QRS de aVF positivo); 
  • R pode ser >S em v1, desde que não seja > 6mm;
  • R tem que ser > S em V6. 

Padrão adulto – 8 anos até adolescência 

  • Eixo está nos quadrantes inferiores (QRS de aVF positivo); 
  • R deve ser < S em V1; 
  • R deve ser > S em V6. 

          2. A Onda P é sinusal? 

          • Positiva em D1 e D2, e plus – minus em V1. 

          Existe doença atrial? 

          • Átrio esquerdo: Usar Morris (porção negativa da onda P ≥ 1mm de amplitude e duração). 

          3. Intervalo PQ 

          • Entre 80 a 160 ms (crianças têm PQ mais curto). 

          4. QRS para doença ventricular? 

          4.1. Sobrecarga Ventricular Direita 

          CritérioPontuação
          R V1 + SV6 ≥  182 pontos
          R pura V11 ponto
          S > R em V61 ponto
          QRS > 120ms + BRD1 ponto
          q em V11 ponto
          Se pontuação for  2 pontos: Sobrecarga Ventricular Direita. Se pontuação = 1 ponto: – Sugestivo de Sobrecarga Ventricular Direita. Esse score também serve para doença atrial direita. 
          de Alencar JN, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, Knoblauch WS, et al. ECG criteria and diagnostic score for right ventricular disease in children: The CHILDHEART study. Journal of Electrocardiology. 2025 Sep 18;92(500):154088.

          4.2. Sobrecarga Ventricular Esquerda 

          • Índice CHILDHEART:
            • RV1 + RV6  37mm em qualquer idade e sexo. 
          • Peguero–Lo Presti modificado:
            • SV4 + SV3 ≥≥ 35mm para < 3 anos 
            • SV4 + SV3 ≥≥ 49mm para  ≥ ≥ 3 anos 
          de Alencar JN, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, Knoblauch WS, et al. ECG criteria for diagnosing left chambers disease in Pediatrics: The CHILDHEART study. Journal of Electrocardiology. 2025 Sep;92(500):154087.

          5. Onda T 

          • Onda T pode ser negativa em aVR, D3, V1 e até V3 (talvez até V4). 
          • Não pode ter supras nem infras. 

          Pontos importantes 

          O CHILDHEART até o momento não analisou alterações de repolarização, tais alterações estão sendo estudadas para a fase 2. 

          Referências

          1. de Alencar JN, Costa IR, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, et al. Age-related ECG milestones for rapid detection of congenital heart disease in children: A diagnostic test accuracy study. Journal of Electrocardiology. 2025.
          2. de Alencar JN, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, Knoblauch WS, et al. ECG Criteria and Diagnostic Score for Right Atrial Disease in Children: The CHILDHEART Study. Pediatric Cardiology. 2025.
          3. de Alencar JN, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, Knoblauch WS, et al. ECG criteria and diagnostic score for right ventricular disease in children: The CHILDHEART study. Journal of Electrocardiology. 2025 Sep 18;92(500):154088.
          4. de Alencar JN, Monteiro JAM, Furtado JT, Sacre RC, Guerra CB, Knoblauch WS, et al. ECG criteria for diagnosing left chambers disease in Pediatrics: The CHILDHEART study. Journal of Electrocardiology. 2025 Sep;92(500):154087.
          5. Scheffer MK, De Marchi MFN, de Alencar Neto JN, Felicioni SP. Eletrocardiograma de A a Z. São Paulo: Manole, 2024. 
          6. Scheffer MK, Ohe LN, de Alencar Neto JN. Manual Prático de eletrocardiograma. 2022. 
          7. Alencar JN. Tratado de ECG. 2022. 
          • João Vitor Gardelli Trindade

            Estudante de Medicina pela Universidade de Santo Amaro (UNISA), com forte interesse nas áreas de ensino, aprendizagem e divulgação científica. Atualmente, exerço a função de Diretor Científico da Liga de Cardiologia da Faculdade de Medicina da UNISA, além de ter atuado como coordenador do 3º Curso de Eletrocardiografia promovido pela Liga.

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