O Eletrocardiograma no Diagnóstico Diferencial da Artéria Culpada no Infarto Inferior

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O infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST) na parede inferior é estimado em 40% a 50% de todos os IAMCSST, com uma mortalidade variando de 2% a 9%. É principalmente causado pela oclusão trombótica aguda da artéria coronária direita (ACD) ou da artéria circunflexa (ACX). A identificação da artéria culpada se reveste de importância clínica, pois a evolução em ambos os casos pode ser diferente. Enquanto que nas oclusões de ACD as bradiarritmias são mais comuns, as oclusões de ACX podem levar à disfunção de músculo papilar e insuficiência mitral aguda.

Importância do Eletrocardiograma na Sala de Emergência

O eletrocardiograma é um método diagnóstico indispensável em pacientes na sala de emergência com suspeita de oclusão coronária aguda (OCA), podendo auxiliar no diagnóstico diferencial entre as oclusões de ACD e ACX. Diversos estudos, especialmente nas últimas 3 décadas, analisaram critérios eletrocardiográficos que contribuem para essa diferenciação.

Tabela de Critérios Eletrocardiográficos

Os vários critérios eletrocardiográficos estão resumidos na tabela abaixo:

CritériosACD culpadaACX culpada
InfraST DIPresenteAusente
InfraST aVLPresenteAusente
InfraST DI e aVLaVL > DIAusente
SupraST DII e DIIIDIII > DIIDII > DIII
SupraST V5 e/ou V6AusentePresente
InfraST em aVRAusentePresente
InfraST em V1AusentePresente
Razão infraST V3/supra ST DIII≤1,2>1,2
Razão Σ infraST V1 a V3/Σ supraST DII, DIII e aVF<1≥1
SupraST em V1PresenteAusente
InfraST aVR/infraST aVL<1≥1

Achados Recentes de Revisões Sistemáticas

Entretanto, alguns aspectos merecem destaque. Os resultados de duas revisões sistemáticas com metanálise publicadas mais recentemente mostraram que os melhores critérios para o diagnóstico da artéria culpada no infarto inferior foram o supradesnível de segmento ST (supra-ST) em DIII > DII e o infradesnível de segmento ST (infra-ST) em aVL > DI.

Quando ambos os critérios estão presentes no eletrocardiograma, os dados de metanálise mostraram uma sensibilidade de 80%, especificidade de 92%, razão de verossimilhança positiva de 10 e razão de verossimilhança negativa de 0,21 para oclusão de ACD.

Limitações dos Algoritmos

Surpreendentemente, nenhum dos algoritmos testados em metanálise (como de Fiol e Tierala) se mostrou superior aos critérios mencionados acima. Os autores comentam que isso se deve ao fato de que as excelentes acurácias mostradas nos estudos originais não foram reproduzidas em coortes externas.

Além disso, existe um algoritmo criado para localizar as oclusões proximais e distais de ACD e ACX; entretanto, deve ser aplicado com cautela, pois carece de validação externa e suas razões de verossimilhança não são boas. Por fim, vários autores alertam para os casos de lesões severas presentes em ambas ACD e ACX; nesses pacientes, o desempenho diagnóstico de todos esses critérios fica bastante limitado.

Conclusão

Em conclusão, o eletrocardiograma, quando interpretado de forma criteriosa, pode auxiliar significativamente no diagnóstico diferencial da artéria culpada no infarto inferior. A padronização do uso de critérios eletrocardiográficos mais simples e bem validados pode otimizar a assistência aos pacientes com essa condição clínica.


Pontos Importantes

  • O IAMCSST inferior corresponde a 40%-50% dos casos e tem mortalidade de 2%-9%.
  • Geralmente é causado por oclusão da ACD ou ACX.
  • Supra-ST em DIII > DII e infra-ST em aVL > DI apresentam alta especificidade e sensibilidade para oclusão de ACD.
  • Algoritmos como os de Fiol e Tierala não se mostraram superiores aos critérios mencionados, e o desempenho diagnóstico é limitado em lesões combinadas de ACD e ACX.

Referências

  1. Zhou P, Wu Y, Wang M et al. Identifying the culprit artery via 12-lead electrocardiogram in inferior wall ST-segment elevation myocardial infarction: A meta-analysis. Ann Noninvasive Electrocardiol. 2023;28:e13016.
  2. Liang H, Wu L, Li Y, et al. Electrocardiogram Criteria of Limb Leads Predicting Right Coronary Artery as Culprit Artery in Inferior Wall Myocardial Infarction: A Meta-Analysis. Medicine. 2018;97(24):e10889.
  3. Ravi H, James W, Birnbaum Y. Introducing a new algorithm in inferior ST-segment elevation myocardial infarction to predict the culprit artery and distinguish proximal versus distal lesions. Coronary Artery Disease 2011;22:165–170.
  4. Tierala I, Nikus KC, Sclarovsky S et al. Predicting the culprit artery in acute ST-elevation myocardial infarction and introducing a new algorithm to predict infarct-related artery in inferior ST-elevation myocardial infarction: Correlation with coronary anatomy in the HAAMU trial. J Electrocardiol 2009;42(2):120–127.

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Sandro Pinelli Felicioni

Sou cardiologista, especialista em Ergometria e Reabilitação Cardíaca, doutor em Ciências pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, onde atuo no Setor de Tele-Eletrocardiografia. Também sou editor do site Aprenda ECG.